II Encontro de Grupos de Estudos e Pesquisas Marxistas - Dia 2

quarta-feira, 26 de maio de 2010

II Encontro de Grupos de Estudos e Pesquisas Marxistas

Recife, de 24 a 26 de Maio


Poucas notícias hoje. Após uma noite relativamente mal dormida (acordei e adormeci várias vezes), levantei-me às 6h30, para me arrumar para a apresentação do trabalho no encontro. A apresentação estava marcada para 8h30 e fiquei seriamente preocupado em me atrasar. Não aconteceu. Contando com o horário que acordei, o tempo que levei no percurso até o local de apresentação e tudo mais, cheguei lá às 7h30. Isto me deixou pensando: poderia ter dormido, pelo menos, mais uma hora.

Pouco importa, estava pronto. Não encontrava ninguém conhecido até que um camarada professor de enfermagem em Arapiraca, com um relativo interesse em meu tema chegou. Logo justificou que também teria de apresentar sua pesquisa e, por isso, não poderia assistir à minha apresentação.

O grupo de maceioenses no evento foi, aos poucos, se agrupando no saguão do Centro de Educação, onde ficavam as salas em que se dividiriam os Grupos de Trabalhos de Pesquisa. Meu eixo, era o de Marxismo e Atualidade, sala 39. Seis trabalhos seriam apresentados, dos quais apenas quatro estavam presentes. Entre os que faltaram, o que havia chamado minha atenção. Aquele que tinha como tema o fenômeno jurídico no jovem Marx. Talvez fique para uma tentativa posterior de diálogo.

As apresentações correram bem. Em minha sala, foram apresentados dois trabalhos com temática na educação (Educação Noturna e Mundo do Trabalho; Concepção Educacional dos Movimentos Sociais; não necessariamente com esses títulos, mas com estes temas), um outro sobre Mídia e Movimentos Sociais, e o meu, sobre Democracia em Habermas e Marx. Infelizmente meu tema trazia uma certa quebra na discussão que vinha sendo levada no grupo, o que contribuiu para que poucas intervenções fossem feitas à minha apresentação. Tive a sorte, no entanto, de contar com uma coordenadora de GT que havia feito uma tese de doutorado com tema extremamente relacionado. Assim, algum diálogo ainda pôde ser feito. Vivas à prof. Cláudia de Serviço Social da UFPB!

Logo depois nos encaminhamos para a reunião de grupos de estudos e pesquisas que se deu no mesmo bloco. O professor Daniel Rodrigues (UFPE) explicou que a intensão era a de que pudesse ser construída uma maior integração entre os grupos do Nordeste, com possibilidades de construções mais orgânicas como, quem sabe, uma revista acadêmica. A tarefa mais imediata, e que poderia dar o ponta pé na questão, seria a construção do III EPMARX.

A presença de estudantes e professores da UFAL foi bastante respeitável. Éramos, pareceu-me, maioria. Estávamos quase toda a delegação lá. Prof. Ivo Tonet, foi o primeiro a levantar a necessidade de tratarmos logo da escolha de eixos temáticos para o próximo encontro, como uma forma de incentivar a produção teórica em torno destas questões. Foram elencados temas, não necessariamente com estes títulos, como Marxismo e América Latina; História do Marxismo; Marxismo e Movimentos Sociais; Marxismo e Comunicação; Marxismo, Política e Transição; etc.

Saí com uma impressão particularmente positiva das iniciativas tomadas. A discussão continuará às 11h do dia 26, para o fechamento desta primeira etapa de contatos. Temos uma boa oportunidade na mão de organizamos algo interessante em relação à produção coletiva de conhecimento radicalmente crítico no Nordeste. Para a UFAL, já se mencionou a organização de uma prévia para o próximo EPMARX em solo alagoano.

Durante a tarde, teríamos uma apresentação de doutorado em educação que, pela especificidade da temática, resolvi não acompanhar. Ao invés disso, pude contar com uma conversa agradável durante toda a tarde com camaradas como Gabriel “Bolinha”, Liana, Ivo Tonet, JP, Virgínio e Bezerra. Todos da delegação alagoana. Acabamos fazendo o lanche da noite juntos.

Voltamos para a mesa que contou com a presença de Newton Duarte (UNESP) e Epitácio Macário (UECE), “Todo educador precisa ser educado”. A frase vem da terceira Tese ad Feuerbach, de Marx. As apresentações dos professores foram, em linhas profundas, bastante consensuais, pelo que tentarei reproduzir apenas o que considerei mais interessante.

Duarte fez uma análise muito boa acerca do esvaziamento dos programas curriculares de formação de professores pelos quais a universidade passa hoje. Remeti, imediatamente, à luta que levantamos enquanto estudantes acerca da precarização das licenciaturas que enfrentávamos na UFAL. As pedagogias da competência, do professore reflexivo, entre outras, que se transvestem de uma tentativa de método de ensino que visa a aproximar aluno e professor, na verdade, servem de máscaras para uma formação precária, para o serviço precário do educador que atuará na classe trabalhadora.

Esta seria a reflexão da terceira Tese ad Feuerbach: nossos educadores, são educados em uma sociedade de classes que não pretende socializar o conhecimento entre todos. Construir uma práxis revolucionária na educação seria lutar por esta socialização, que seria fundamental para a revolução socialista.

A tese me deixou intrigado. E sei que não fui o único. Como poderíamos socializar o conhecimento (e que conhecimento?) em uma sociedade marcada pela desigualdade de classes. Me parece que esta resposta não é bem colocada pelos expositores.

Saindo da palestra, acabei encontrando com os camaradas da filosofia da práxis (como denomino os estudantes marxistas da Filosofia – UFAL). Passamos algumas poucas horas de botequins juntos conversando sobre o dia e sobre organizações revolucionárias, ou nem tanto. Este pode parecer o motivo para um relato tão resumido e nem tão rigoroso hoje. Mas não. É que, realmente, achei que o dia apesar de bom, não teve tantas coisas relevantes assim.

Amanhã nos encaminhamos para o último dia de encontro. Mais uma reunião dos pesquisadores marxistas e movimentos sociais do Nordeste e mesa com Ivo Tonet. Talvez tenhamos mais a comentar.

II Encontro de Grupos de Estudos e Pesquisas Marxistas - dia 1

segunda-feira, 24 de maio de 2010

II Encontro de Grupos de Estudos e Pesquisas Marxistas

Recife, de 24 a 26 de Maio


Recebi a notícia por e-mail. A vida contemporânea tem dessas facilidades. As coisas pipocam em nossas caixas de mensagens. A maior parte delas, uma tremenda porcaria. Não era o caso desta mensagem particular.

Ela divulgava o II Encontro de Grupos de Estudos e Pesquisas Marxistas (II EPMARX), realizado no Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco. A iniciativa é do Grupo de Estudos Marxistas (GEMA) da UFPE. Falava de um objetivo básico: reunir pesquisadores que tomem o materialismo histórico dialético como método da produção de conhecimento, num sentido de desvelamento crítico da realidade para a sua transformação. Bem, sem grandes presunções, claro, cá estou eu com uma pequena pesquisa sobre Habermas e Marx, a qual alguns trechos estão disponíveis aqui no Antes Quixote (ainda pretendo postar a continuação até a conclusão).

O que realmente me chamou atenção foi, no entanto, a existência do próprio GEMA. Peguei-me diversas vezes pensando em por que não temos algo como isto na UFAL. Um grupo que reúna marxistas (ainda que de matizes diferentes) para uma produção coletiva de conhecimento crítico. E na UFAL possuímos ótimos nomes para isto. Um de meus objetivos é acompanhar a atuação do GEMA, tentar entender como ele funciona e, quem sabe, não dar uma mãozinha, com isso, na construção de algo similar em Maceió.

A questão é que temos pela UFAL uma porção considerável de grupos que se organização sob a perspectiva marxista para a discussão dos mais variados temas. Desde grupos do movimento estudantil a grupos de pesquisa consolidados isto é uma realidade. No entanto, não conseguimos, ainda, organizar um evento que possa contar com toda uma estrutura que possa permitir um maior debate entre estas esferas. Será que o GEMA pode ser um modelo para tal?

Bem, tivemos hoje o primeiro dia de encontro. Resolvi que seria interessante compartilhar impressões pelo blogue e, portanto, aí vai. Acabo de voltar para a pensão em que estou alojado e que tem acesso à internet no quarto. Então não haveria mesmo desculpa para não fazer isto. Mesmo que sejam só impressões iniciais e que não componham um relato intensivo. Acredito que mais informações poderão ser conseguidas com a própria organização no blogue do II EPMARX.

Pela primeira vez visito a UFPE. Isto não é essencial para o relato, claro, mas apenas para registrar, tenho que deixar claro que, parece-me, não há nada de muito diferente das outras universidades públicas que visitei. O aspecto meio lúgubre dos prédios, as vias mal conservadas, amplos campos não construídos cobertos por mato (não simplesmente grama). A não ser pela dimensão muito maior, poderia achar que estava na UFAL. Só que lá em Maceió quase não temos prédios com mais de um andar. Nada comparado à UFPE.

Hoje foi o primeiro dia de encontro com uma programação bastante leve. O Credenciamento começaria à 14h30. A mesa de abertura foi marcada para 19h. Como não teria muito o que fazer durante a tarde na UFPE, resolvi que faria o credenciamento antes da palestra mesmo. Passei a tarde descansando. Por volta das 17h30 já estava credenciado esperando pelo horário da palestra.

Enquanto esperava, li o encarte produzido pela organização do evento quando soube o horário das apresentações de trabalhos, incluindo o meu. 8h30 do dia 25. Amanhã. O que me força a tentar descansar hoje. São 20 min de apresentação. Poucas apresentações por grupos para permitir uma discussão acerca delas. Tive uma surpresa que julgo positiva. Em meu grupo, um camarada, que não conheço, chamado Éder Ferreira apresentará o trabalho de título “Marxismo & Direito: o fenômeno jurídico na obra do jovem Marx”. É justamente o tema que pretendo desenvolver no projeto de mestrado para o qual tenho reunido alguma bibliografia. Talvez possamos trocar figurinhas. Talvez, inclusive, eu seja forçado a buscar outro tema, caso a pesquisa já esteja em termos que cuidem suficientemente bem da questão. Fiquei ansioso para acompanhar a apresentação e o debate sobre o trabalho. É o primeiro do cronograma. O meu é o quarto.

Durante a noite, teríamos a palestra de abertura “Sujeito Revolucionário: quais os desafios na atualidade?”, com intervenções do Prof. Dr. Mauro Iasi, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e do Prof. Dr. Jorge Luiz Acanda, da Universidad de La Habana. Infelizmente o professor cubano não pôde estar presente. Por complicações anunciadas durante a abertura do evento, ele só se fará presente no encontro na quarta-feira (26/05). Iasi acabou assumindo a mesa sozinho, com um tempo de intervenção relativamente longo. Não sei se seria o mesmo caso ambos os professores estivessem na mesa.

Duas boas coisas, no entanto. A primeira, menos importante, a pontualidade foi excepcional. Não é comum encontrar eventos que comecem exatamente na hora marcada, seja por parte da organização, seja por parte do público. Não foi o caso hoje. A segunda, na fala de abertura da Organização do EPMARX, levantou-se o interesse de reunir os grupos de estudos amanhã, às 11h, logo após as apresentações, para trocas de experiências. Eu entendi que seriam, principalmente, experiências organizativas a serem debatidas. Estarei com certeza no espaço.

Para quem já viu alguma intervenção do Mauro Iasi o que vou dizer soará muito claro. Ele possui um domínio de público admirável. Consegue falar de temas importantes com uma leveza invejável. Talvez, em certos momentos, claro, esta leveza acabe implicando em certas simplificações muito pesadas. Mas não acho que foi o caso predominante hoje.

Pretendo, claro, apenas fazer um relato rápido do dia, mas ele seria completamente esvaziado se não contasse com uma rápida sistematização da palestra do Iasi. Pois bem, tentando fazer isso de maneira muito rápida para que os leitores tenham, ao menos, noção do que aconteceu, não o faço pretendendo ser um repasse conclusivo. Aliás, é possível (e muito provável) que impressões diferentes tenham surgido em outros observadores.

Iasi, tratando do tema do sujeito revolucionário hoje, dividiu a apresentação em três pontos, todas englobando um aspecto das atuais críticas ao marxismo. Primeiro, o fato de que, para Marx, assim como para Hegel, a história teria uma teleologia em si mesma, o que seria falso, não havendo sentido no processo histórico e, por isso mesmo, não havendo sujeito dele. Segundo, Marx teria equivocado-se em sua previsão da simplificação dos conflitos de classe entre proletariado e burguesia, já que hoje, o que teríamos, na verdade, seria uma ampla camada média, que não está identificado a qualquer destes setores. Terceiro ponto, a reestruturação produtiva teria desconstruído a sociedade com base no paradigma do trabalho.

Em termos muito panorâmicos, a fala do Iasi sustentou o seguinte: a) há uma diferença entre o papel da teleologia na história entre Hegel e Marx. Hegel, como pensador da ascensão da burguesia teria conseguido perceber diversos nexos da materialidade, especialmente expressos em sua compreensão dialética do mundo. No entanto, ele jamais teria saído do idealismo, colocando no espírito absoluto, o sujeito da história. Marx traria um salto qualitativo na perspectiva de que o sujeito histórico é um sujeito material, a classe proletária. Não se trataria, evidentemente, do ser puramente empírico da classe, mas de suas determinações ontológicas. Assim, os homens poderiam fazer história, e ela não teria, como gostariam Niezsche e Foulcault, um decorrer no eterno presente sem qualquer sentido; b) as classes possuem, ainda, uma importância central no campo da construção histórica. Iasi citou a tese de Dahrendorf para exemplificar uma destas formulações. Marx teria acertado absolutamente tudo em relação ao séc. XIX. Mas suas previsões não se concretizaram. Marx teria sido um teórico da escassez, oposto ao séc. XX, onde viveríamos a sociedade da abundância, sendo possível a igualdade não apenas formal, mas material. Desta forma, o conflito deslocaria-se dos espaços da produção, do trabalho, para a política, que seria o espaço da distribuição de riqueza. c) por fim, com referência, inicialmente a Hannah Arendt e, mais tarde, a Gorz, Iasi exemplificou as teses de fim do proletariado com o processo de reestruturação produtiva. Em sua concepção, que acredita estar lastreada em Marx, o proletariado, no entanto, não apenas não diminuiu, como aumentou em termos absolutos. Seu cálculo é de que o que antes contava como 1,5 bilhões, estaria hoje na casa dos 3 bilhões de pessoas no mundo. Ele conta, aí, não apenas o operariado, mas todos aqueles que dependem da venda de sua força de trabalho para a sobrevivência. Com isso, estariam resguardadas todas as outras questões, e, inclusive, a atualidade do pensamento de marxista e marxeano aí baseados.

Algumas questões interessantes foram levantadas pelos espectadores durante os debates. Mas gostaria apenas de citar uma das questões colocadas pelo Prof. Dr. Ivo Tonet (UFAL) durante o debate, questionando o critério do assalariamento para a definição da classe proletária. Citou, como nome importante nesta discussão, o Prof. Dr. Sérgio Lessa (UFAL). Iasi, respondeu resguardando sua concepção. Para ele, a forma que Marx descreve o trabalho no cap. V d'O Capital, seria apenas a forma singular do trabalho. Livre de suas determinações concretas. No capitalismo, o trabalho incluiria os trabalhadores produtivos de mais-valia, o que coloca, no seio da classe proletária, uma ampla gama de assalariados. Ele citou que concorda com o Ricardo Antunes, após a revisão que o mesmo fez em sua tesa da classe-que-vive-do-trabalho. Para ele, seria a classe-que-vive-da-força-de-trabalho. Citou os exemplos do mestre-escola e da bailarina.

Não pretendo comentar a questão, pois isto mereceria um debate isolado sobre o tema. É, de fato, a questão central do debate interno ao campo marxista hoje. Claro que saímos do debate com a discussão ainda nas cabeças, cada qual tomando uma posição, que não pode ser mais do que preliminar por ora. A minha, por enquanto, é a do Lessa. Proletariado é o operariado, aquele que atua na produção de riqueza material, e não simplesmente qualquer assalariado que produza mais-valor. Isto não retira a importância de organização de todas as outras categorias.

Foi um dia agradável. Ainda preciso preparar a sistematização de minha apresentação amanhã de manhã. Portanto, até as próximas notícias.

É cínica e inaceitável a pretensão de dar validade jurídica à Lei de Anistia’

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Entrevista com o jurista Dalmo de Abreu Dallari sobre a recente decisão do STF acerca da Lei da Anistia. Do Correio da Cidadania.



É cínica e inaceitável a pretensão de dar validade jurídica à Lei de Anistia’


Escrito por Gabriel Brito – Da Redação
18-Mai-2010

No dia 29 de abril, os ministros do Supremo Tribunal Federal tiveram em suas mãos um dos mais acalorados juízos dos novos tempos democráticos. Sete dos onze ministros da mais alta corte do país decidiram que a Lei de Anistia, 6983/79, promulgada pelos próprios usurpadores do poder, abarca os acusados, ou confessos, de praticarem torturas e outros crimes compreendidos mundialmente como de lesa humanidade.

Nesta entrevista ao Correio da Cidadania, o jurista Dalmo de Abreu Dallari, referência da luta por democracia e direitos humanos no Brasil, demole com a argumentação dos ministros do STF, afirmando sem hesitação que a decisão do tribunal foi estritamente política. Para tal encaminhamento, Dallari aponta a influência do ministro da Defesa, Nelson Jobim, que já presidiu a suprema corte brasileira.

Além disso, o professor emérito da USP desqualifica completamente o argumento, encampado por diversas correntes da mídia e sociedade, de que a Anistia significou um acordo entre opressores e oprimidos, de modo que a reconciliação histórica já é um fato consumado e bem sucedido. "Foi cínica a imposição daquela fórmula, sendo igualmente cínica e absolutamente inaceitável a pretensão atual de lhe dar validade jurídica". Apesar de tudo, lembra que nada impede novas ações e argumentações na justiça contra o que "foi uma auto-anistia".

A entrevista pode ser conferida a seguir.

Correio da Cidadania: Como analisa o julgamento da ADPF 153 realizado pelo STF e que considerou que a Lei de Anistia deve continuar sendo interpretada da mesma maneira, como nos últimos 30 anos?
Dalmo de Abreu Dallari: A decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a Lei de Anistia foi, obviamente, calcada em motivos políticos, não jurídicos. Para que se perceba isso, basta lembrar que, por decisões da ONU e de outros organismos internacionais, sempre com a participação e a concordância do Brasil, a tortura foi qualificada como crime contra a humanidade, ficando estabelecido que, quanto aos crimes contra a humanidade, não ocorre prescrição.

Isso foi estabelecido justamente com o objetivo de impedir que os responsáveis por crimes contra a humanidade fiquem impunes, orientação que tem sido reiterada em decisões de tribunais internacionais, como também em tribunais nacionais que julgaram torturadores, como tem ocorrido em vários países da América do Sul.

Ainda bem recentemente isso foi registrado na Argentina, onde um general torturador foi condenado por crimes praticados há algumas décadas, no período ditatorial. Nada disso foi considerado pela maioria dos membros do Supremo Tribunal Federal, que consideraram anistiados os torturadores brasileiros.

CC: Essa decisão seria fruto de uma recente politização do judiciário brasileiro, conforme acreditam alguns, chegando por vezes a entrar em conflito com outros poderes (não necessariamente nesse caso)?

Dalmo de Abreu Dallari: Um aspecto muito importante dessa decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a Lei de Anistia é a constatação de uma coincidência que reforça a convicção da necessidade de mudança do critério de escolha dos ministros da Suprema Corte.

Com efeito, tanto no voto do relator quanto nos dos julgadores que o acompanharam, verifica-se, na fundamentação, absoluta coincidência com os argumentos usados reiteradamente pelo ministro Nelson Jobim para sustentar a aplicação dos benefícios da Lei de Anistia aos militares que, direta ou indiretamente, participaram das práticas de tortura.

Sabe-se que o ministro Jobim exerceu grande influência na indicação de vários dos atuais integrantes do Supremo Tribunal Federal, o que tem gerado a convicção de que esse fato teve grande peso na tomada de posição de vários ministros, que, à semelhança do ministro Nelson Jobim, se ativeram a argumentos políticos, deixando de lado a fundamentação jurídica.

CC: Dessa forma, seria alto o grau de probabilidade de reversão dessa decisão nas cortes internacionais, aquelas às quais o Brasil aceita se submeter, como Corte Internacional dos Direitos Humanos? Ou de outra forma, ainda existem outros meios de mudarmos o juízo sobre o assunto dentro do nosso próprio judiciário?

Dalmo de Abreu Dallari: Um ponto de fundamental importância que deve ser assinalado é que a decisão do Supremo Tribunal, pelas circunstâncias em que foi proferida, bem como por seus fundamentos, eminentemente políticos, não elimina a possibilidade de questionamento jurídico da Lei de Anistia sob vários aspectos.

Com efeito, ocorre, em primeiro lugar, que a tortura é crime contra a humanidade, imprescritível, podendo ser promovida em qualquer tempo a responsabilidade dos torturadores. A par disso, ressalte-se que a decisão do Supremo Tribunal foi tomada com base apenas nos argumentos expostos pela autora da ação (OAB), considerando a tortura e a anistia num enfoque abstrato e genérico, o que não impede a propositura de outras ações, por outras pessoas, com fundamentos diferentes.

Assim, por exemplo, é perfeitamente possível que um torturado ou familiar de vítima de tortura ingresse em juízo para pedir uma reparação civil. Com efeito, uma das conseqüências da tortura foi a perda de fontes de subsistência ou mesmo de bens materiais, em conseqüência de atos ilegais praticados em repartições públicas.

Sendo assim, é perfeitamente jurídico e tem base legal a cobrança de indenização em ação judicial contra o Estado. Esses prejuízos decorrentes da tortura nunca foram reparados e continuam a ocorrer, cabendo a propositura de ação e, dentro dela, a verificação das circunstâncias em que ocorreu a tortura para fixação das responsabilidades. Isso é necessário até mesmo para que o Estado, sendo condenado, mova ação regressiva para que os servidores que procederam ilegalmente, e com isso levaram à condenação do Estado, façam a reparação devida.

CC: Um dos grandes argumentos dos ministros que votaram pela manutenção da Lei de Anistia era o de que já fora celebrado acordo entre os antagonistas da disputa política de então, beneficiando, portanto, os crimes de lado a lado. É aceitável esse embasamento da mais alta corte do país diante de diversos relatos históricos de que não havia igualdade de condições alguma na época do dito acordo?

Dalmo de Abreu Dallari: É absolutamente inaceitável, por ser contrário à história e ao bom sendo, o argumento de que houve acordo entre os antagonistas na luta política, para que a anistia fosse "ampla, geral e irrestrita", beneficiando, portanto, tanto os que agiram contra o dispositivo ditatorial, tentando impedir a tortura, quanto os torturadores.

Na realidade, a Lei de Anistia foi uma conquista penosa e difícil, que só foi possível porque o dispositivo ditatorial já estava dando sinais de fraqueza, em decorrência da divulgação das práticas de violência e muita corrupção nos bastidores da ditadura. Prevendo que seria impossível sustentar por muito tempo o sistema ditatorial, seus principais dirigentes procuraram valer-se de sua posição de superioridade para garantir antecipadamente sua impunidade futura.

Isso não foi levado em conta pelos ministros que julgavam a questão em momento algum, em termos comparativos e proporcionais à idéia de ‘acordo entre os contrários’.

Muitos brasileiros tinham sido obrigados a se refugiar no exterior, outros estavam presos ou sofrendo constantes ameaças, além de restrições concretas em seus direitos e, por isso, os defensores da restauração democrática queriam que a ditadura fosse extinta o mais rápido possível, para que os refugiados pudessem retornar e todos se reintegrassem na vida social e familiar. Além disso, a possibilidade de fazer exigências, impedindo a afirmação formal da impunidade dos torturadores era impossível naquele momento.

CC: Portanto, juridicamente, a fragilidade do argumento é facilmente identificável.

Dalmo de Abreu Dallari: Em conseqüência do que mencionei, a Lei de Anistia foi aquela que os mentores da ditadura não puderam impedir que viesse a existir, mas de modo algum corresponde a um acordo verdadeiro, produto da manifestação de vontades livres.

A expressão "anistia ampla, geral e irrestrita" foi a fórmula usada pela ditadura para tentar garantir a impunidade dos torturadores e corruptos, mas foi imposta, foi uma auto-anistia.

Essa pretensa extensão da anistia, que é a expressão do maior cinismo, já tem sido expressamente negada por tribunais que tiveram a oportunidade de se pronunciar sobre ela, não havendo uma única decisão que lhe dê a mínima validade.

Em conclusão, pode-se afirmar que foi cínica a imposição daquela fórmula, sendo igualmente cínica e absolutamente inaceitável a pretensão atual de lhe dar validade jurídica.

Gabriel Brito é jornalista.

Ato Público 18 de Maio contra a Anistia aos Torturadores!

sábado, 15 de maio de 2010

Olá

Subscritores(as) do Manifesto Contra a Anistia aos Torturadores!





Cada um dos 21 mil subscritores deu a sua contribuição para o fortalecimento da democracia e o manifesto foi juntado ao processo com todas as assinaturas, mas, lamentavelmente, o Supremo Tribunal Federal negou punição para os torturadores da ditadura.

Os ministros Carlos Ayres Britto e Ricardo Lewandowski votaram favoravelmente à punição e disseram que os crimes comuns não podem ser beneficiados pela anistia.

A decisão do STF foi na contramão do fortalecimento do sistema democrático, de respeito aos direitos humanos, ao contrário das ações dos outros países da América Latina e em choque com as decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos/OEA, do qual o Brasil faz parte e que tem audiência marcada para os próximos dias 20 e 21 de maio, no primeiro caso da ditadura militar brasileira.



Convidamos todos e todas a estarem presentes no

ATO PÚBLICO para manifestarmos pelo fim da impunidade dos torturadores

Dia: 18/05/2010 às 14h30

Local: Pateo do Colégio (estação Sé ou São Bento do Metrô), em São Paulo



Temos à frente o julgamento a ser realizado pela Corte e o Estado brasileiro, que assumiu compromissos internacionais, poderá construir um país, em que a dignidade humana seja efetivamente um valor.

A impunidade da tortura de ontem fomenta a tortura de hoje.



Contamos com sua presença!

Convide seus amigos e familiares!

Avise no seu twitter, blog, etc.





Comitê Contra a Anistia aos Torturadores

O que é Criminalização?

domingo, 9 de maio de 2010

Texto escrito para o jornal "A Voz do Direito", do Centro Acadêmico Guedes de Miranda, Direito - UFAL.

O que é criminalização?


Na Universidade Federal de Alagoas tornou-se imensamente atual o debate em torno da criminalização dos Movimentos Sociais. Três estudantes estão sendo processados criminalmente por sua participação nas mobilizações que giravam em torno da discussão acerca da adesão da universidade ao Programa de Expansão e Reestruturação das Universidades (ReUni), no ano de 2007.


O debate é polêmico. Envolve aspectos variados que vão desde a qualidade da educação superior no país, à democracia no interior das universidades e além. Um ponto em especial, no entanto, merece ser explorado: a identificação de posturas do Movimento Estudantil a condutas criminosas.


A comunidade interior à UFAL se polarizou em relação à questão. A Reitoria e seus apoiadores têm plena convicção de que os estudantes merecem ser punidos criminalmente pelos atos que cometeram durante as citadas manifestações. Por outro lado, professores, estudantes e funcionários da universidade assinam um manifesto contra a punição. Até mesmo a mídia local tem se manifestado acerca da questão, em geral a favor da punição criminal dos estudantes. Vergonhoso exemplo é o editorial d'O Jornal da edição de 02 de maio, intitulado de “O esquerdismo estudantil”. Curiosamente, na mesma página, há textos assinados por figuras políticas do estado envolvidas reiteradas vezes em enormes escândalos de corrupção. Nunca se viu O Jornal pedir punição criminal para políticos corruptos, apesar de isto ser um crime considerado grave mesmo pela maioria de seus leitores.


A questão que se levanta é: por que a idéia da punição criminal dos estudantes divide opiniões? Tendo cometido um crime, não deveriam ser punidos de pronto?


O que parece emergir da polarização de opiniões acerca da questão é, justamente, o seu caráter eminentemente político. Por mais estranho que possa parecer aos acadêmicos de direito penal, o crime é mais do que a soma da anti-juridicidade, da tipicidade e da culpabilidade de seus agentes. Ele é uma construção sócio-política com marcada evolução histórica. Entender esta questão é fundamental para a discussão que, hoje, preenche os corredores da UFAL.


Os discursos pró-punição tendem a apresentar um traço comum: o crime é um mal e deve ser erradicado. Se através da punição preventiva ou do mais crasso retributivismo, a diferença é pequena aqui. O crime deve ser combatido e eliminado, como se isso fosse possível. Ele é um mal. Atenta contra a democracia, ou a moral, ou a paz social, ou os interesses juridicamente defendidos. As palavras são muitas para classificar a mesma coisa.


Acontece, porém, que o crime não é um mal. A mais crítica criminologia demonstrou que o crime é, apenas, uma condição politicamente definida para um determinado comportamento, no intuito de defender determinado interesse. Demonstrou, por consequência, que o processo de criminalização não é mais do que uma seleção de determinados indivíduos tidos como “desviantes”, que bem poderiam ser poupados ou não.


A criminalização se dá em duas vias. A primeira, na escolha das condutas a serem consideradas criminosas. Através de um determinado processo legislativo define-se o que deve ser punido. Ou seja, as camadas da população com maior influência política conseguem definir a defesa de seus interesses por parte do Estado. Esta defesa, em grande parte, se dá contra posturas das camadas oprimidas que, por esta mesma condição, podem chegar a pôr em xeque determinados interesses dominantes. Por exemplo: a propriedade. Isto, claro não exclui a criminalização de condutas universalmente prejudiciais como o homicídio. Mas explica como crimes praticados por pobres tendem a ser considerados mais graves do que crimes de colarinho branco, por exemplo. De quebra, explica porque O Jornal pede punição para estudantes, mas não para políticos corruptos.


A segunda via da criminalização é a seleção dos punidos. Definir que determinadas condutas encaixam-se em um específico tipo penal é um evidente processo de interpretação. Se todos aqueles que poderiam ter suas condutas identificadas a tipos penais fossem concretamente processados e punidos, o Estado não faria absolutamente mais nada além disto. O número de crimes que passa ao largo do sistema penal é surpreendente. Menos de ¼ dos crimes cometidos é efetivamente punido. No entanto, um largo número de punidos pertence às camadas mais pobres e aos movimentos sociais que a elas se aliam. Isto faz parte da criação de um inimigo interno, que serve para justificar condutas repressoras contra aqueles que discordam e tomam atitudes contra interesses poderosos.


No caso da UFAL, três estudantes correm o risco de serem punidos por uma manifestação que exigia um plebiscito na universidade acerca da adesão ao ReUni. Exigiam mais debates e uma decisão mais ampla do que a que foi tirada pelo Conselho Universitário. Por que não são processados os quase cem estudantes que participaram da exata mesma mobilização? A punição exemplar é execrada pelo direito penal liberal. No entanto, as evidências parecem demonstrar que nossos gestores, jornalistas e juristas não costumam se preocupar com isto. Eis o caso UFAL.


Por fim, uma última reflexão. Em sessão histórica o STF votou, por 7 a 2, pela não punição dos torturadores das forças militares e policiais do Brasil durante duas décadas de ditadura militar. A maior parte dos países latino-americanos e europeus que passaram por esta decisão tomaram-na em sentido contrário e puniram este crime de lesa humanidade. Este assunto merece uma discussão a parte. Mas nos arriscamos a levantar a questão: em um país que perdoa torturadores da ditadura, estudantes que exigem um plebiscito são selecionados para a punição penal pela mídia, pela gestão da universidade, pelo MPF e outras agências.


Como vai a democracia de vocês?

Grécia: Professores ocupam estação de TV

Professores ocupam estação de TV na Grécia para denunciar as políticas do governo e do FMI para a educação pública do país. O menor dos resultados: são 17.000 professores demitidos.

Fonte: http://www.youtube.com/watch?v=j8TGCYL3i30&feature=player_embedded


Semana Universitária Expressão Popular em ALAGOAS

sábado, 8 de maio de 2010

Divulgando semana de palestra com excelente programação.

Semana Universitária Expressão Popular em ALAGOAS

A atualidade do marxismo

Mini-Cursos:

Profª Célia Nonata
Tema: Conflitos de terra
Local: Auditório do ICHCA
Data: 10 e 11 de Maio
Horário: 14:00h as 17:00h

Prof. Alberto V. Flores
Tema: Revolução Mexicana: 1910 a 1017
Local: Auditório do ICHCA
Data: 13 e 14 de Maio
Horário: 14:00h as 17:00h

Prof. Ivo Tonet
Tema: Estado e Revolução
Local: Auditório da Biblioteca Central
Data: 10, 12 e 13 de Maio
Horário: 14:00h as 16:45h

Profª(s) Belmira Magalhães e Geice Silva
Tema: A questão de gênero e nos movimentos sociais
Local: Auditório da Biblioteca Central
Data: 11 de Maio
Horário: 14:00h as 16:45h

Prof. Ciro Bezerra
Tema:Milton Santos e as Transformações Sócio-históricas na Modernidade
Local: Mini-auditório da Biblioteca Central
Data: 12 e 13 de Maio
Horário: 14:00h as 16:45h

Palestras:

Abertura
LANÇAMENTO do livro “Glosas Críticas” (Karl Marx)
Palestrantes: Adriano Nascimento e Belmira Magalhães
Tema: Marxismo e Política
Local: Auditório do CSAU
Data: 10 de Maio
Horário: 19:00 as22:00

Palestrantes: Gilmaísa Macedo e Norma Alcântara
Tema: Reprodução Social e Alienação
Local: Auditório do CSAU
Data: 11 de Maio
Horário: 19:00 as 22:00

Palestrantes: Fabiano Duarte e Golbery Lessa
Temas: A esquerda na “Nova República” (prof. Fabiano)
Perfil da Classe Operária Alagoana na Contemporaneidade e suas Tarefas Políticas (prof. Golbery)
Local: Auditório do CSAU
Data: 12 de Maio
Horário: 19:00 as22:00

LANÇAMENTO dos livros:

Projeto Democrático Socialista do MST: alguns elementos lingüístico-ideológicos (José Nascimento)
Cana, Casa e Poder (Cícero Albuquerque)
Palestrantes: Cícero Albuquerque e José Nascimento
Tema: Processos Sociais Rurais e Lutas Coletivas em Alagoas
Local: Auditório do CSAU
Data: 13 de Maio
Horário: 19:00 as22:00

Palestrantes: Reivan Marinho
Tema: Reestruturação Produtiva e as Atuais Formas de Controle do Capital sobre o Trabalho
Local: Auditório do CSAU
Data: 14 de Maio
Horário: 19:00 as22:00


Inscrições:

Local: ICHCA – UFAL Baquinha Expressão Popular

Contato:

Tico 9927 2019
Pablo: 9636 2851

E-mail: alagoas@expressaopopular.com.br

Obs: Mini-cursos com vagas limitadas.

192º Aniversário do Nascimento de Karl Marx

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Texto de Engels sobre a principal obra do pensador alemão. A idéia de reproduzi-lo aqui, para não deixar a data de aniversário de Marx (05 de maio) passar em branco, foi retirada do site do PCB. O texto, no entanto, está disponível no marxismo.org.

192 anos de nascimento de Karl Marx

Escrito por PCB | 07 Maio 2010
imagemCrédito: Marxists.org

Comemorado o aniversário de 192 anos de nascimento de Karl Marx, O PCB o homenageia nas palavras de Engels.

O Capital de Karl Marx

Friedrich Engels

13 de Março 1868

Desde que há capitalistas e obreiros no mundo, não apareceu livro de tão grande importância para os obreiros como este. As relações entre o Capital e o Trabalho, eixo em torno do qual rota todo o nosso sistema social do tempo presente são cá, pola primeira vez, desenvolvidos cientificamente, com uma profundidade e com uma clareza só possíveis para um alemão.

Por mais preciosos que sejam e ficarão como tais os escritos dum Owen, dum Saint-Simon, dum Fourier, foi reservado a um alemão alçar-se à altura desde a que se pudesse enxergar com claridade e panoramicamente o domínio inteiro das relações sociais modernas, de igual modo que aparecem aos olhos do espectador, situado no mais alto cimo, os sítios montanhosos menos altos.

A economia política ensina-nos até agora que o trabalho é a fonte de toda a riqueza e a medida de todos os valores, de tal jeito que dous objectos cuja producção custou o mesmo tempo de trabalho têm também o mesmo valor e devem também ser necessariamente trocados uns polos outros em vista que somente valores equivalentes podem ser trocados entre si.

Mas ensina, ao mesmo tempo, que existe uma espécie de trabalho acumulado a que se chama capital; que este capital, graças às possibilidades que contém, multiplica por cem e por mil a produtividade do trabalho vivo e reivindica por isso uma certa compensação a que se chama lucro ou benefício.

Percebemos todos nós que as cousas são, na realidade, assim: os lucros do trabalho morto, acumulado, formam uma massa cada vez maior, os capitais dos capitalistas tomam proporções cada vez mais colossais, enquanto o salário do travalho vivo torna-se cada vez menor, e a massa dos operários que vive unicamente do salário, é cada vez maior e mais pobre. Como resolver esta contradição?

imagemCrédito: Marxists.org

Como pode ter um lucro o capitalista se o obreiro recebe o valor total do trabalho que amplia ao produto? E, no entanto, visto que apenas valores iguais são trocáveis, tem de ser assim.

Por outro lado, como valores iguais podem ser trocados, como o obreiro pode receber o valor inteiro do seu produto, se, como imaginam muitos economistas, este produto é partilhado entre ele e os capitalistas? A economia encontra-se até hoje perplexa face esta contradição, escreve ou balbucia fórmulas confusas e vácuas.

Mesmo os críticos socialistas da economia não foram capazes até aquí de fazer outra cousa do que sublinhar esta contradição; nenhum a resolveu até o momento em que, finalmente, Marx, perseguindo o processo da formação deste lucro até o lugar onde nasce, clareou totalmente o assunto.

No desenvolvimento do capital, Marx parte do facto simples e notório que os capitalistas valorizam o seu capital através da troca; compram mercadoria por dinheiro e a seguir revendem-na por uma soma mais elevada do que lhes custar. Um capitalista compra, por exemplo, algodão por 1000 francos e revende-o por 1100, ganhando assim 100 francos. É a este excedente de 100 francos sobre o capital inicial que Marx chama mais-valor.

De onde surge este mais-valor? Segundo a hipótese dos economistas, só os valores iguais são trocáveis e, no domínio da teoria abstracta, isto é certo. A compra do algodão e a sua revenda não pode, então, fornecer mais valor do que a troca de uma quilograma de prata contra uma soma e uma nova troca desta moeda contra uma quilograma de prata, operação em que não se enriquece nem empobrece. Mas o mais-valor também não pode sair do facto de os vendedores trocarem as suas mercadorias acima do seu valor, ou de os compradores as obterem acima do seu valor, porque sendo cada um deles tanto vendedor como comprador, há, conseqüentemente, compensação.

Isso também não pode surgir do facto de os compradores e os vendedores encarecerem uns com outros o produto, porquanto isso não produziria novo valor ou mais-valor, mas ao contrário, repartiria-se de outra forma o capital existente entre os capitalistas.

Ora, a pesar de que o capitalista compra e revende as mercadorias polo seu valor, tira mais valor do que investiu. Como é que isto pode acontecer?

Nas actuais condições sociais, o capitalista acha no mercado uma mercadoria que possui esta propriedade peculiar, que o seu consumo é fonte de um novo valor, cria novo valor, e esta mercadoria é a força de trabalho.

Qual é o valor da força de trabalho? O valor de cada mercadoria é determinado polo trabalho que reclama a sua produção. A força de trabalho existe sob a forma do operário vivo que precisa, para viver, assim como para sustentar a sua família que garante a reprodução da força de trabalho depois da sua morte, duma soma determinada de meios de subsistência. É, conseguintemente, o tempo de trabalho necessário à produção destes meios de subsistência que representa o valor da força de trabalho. O capitalista paga ao operário à semana e compra assim o emprego do seu trabalho por uma semana. Os senhores economistas estarão, até aquí, de acordo connosco sobre o valor da força de trabalho.

Nesse momento, o capitalista põe o seu obreiro a trabalhar. Durante um tempo determinado, o operário terá fornecido tanto trabalho quanto o representado polo salário semanal. Aceitando que o salário semanal de um operário representa três dias de trabalho, o operário que inícia na segunda-feira restituiu ao capitalista na quarta-feira à tarde o valor total do salário pago.

Mas de seguida para de trabalhar? Muito polo contrário. O capitalista comprou o seu trabalho por uma semana, e é necessário que o obreiro trabalhe ainda os outros três dias da semana. Este mais-trabalho do obreiro, para além do tempo necessário para restituir o seu salário, é a fonte do mais-valor, do lucro, do aumento sempre crescente do capital.

Não se diga que é esta uma suposição gratuita quando se afirmar que o operário produz em três dias o salário que recebeu e que nos outros três dias trabalha para o capitalista. Aliás, que precise exactamente três dias para devolver o seu salário, ou de dous, ou de quatro, é aquí uma cousa totalmente irrelevante que não muda segundo as circunstâncias; pois a cousa principal é que o capitalista, além do trabalho que paga, consegue ainda trabalho que não paga, e não se trata de uma suposição arbitrária, visto que como no dia em que o capitalista não recebesse continuamente do operário o trabalho que ele paga em salário, esse dia, fecharia a sua fábrica porque todo o lucro se esfumaria.

Eis que nos resolvemos todas estas contradições. A produção de mais-valor (de que o lucro do capitalista constitue boa parte) é agora totalmente clara e natural. O valor da força de trabalho é pago, mas este valor é muito menor do que aquele que o capitalista tira da força de trabalho, e a diferença, o trabalho que não é pago, constitue precisamente a parte do capitalista, ou mais exactamente, da classe capitalista.

É assim porque o lucro que, no exemplo citado mais acima, o comerciante de algodão tira do seu algodão, necessariamente deve consistir em trabalho não pago se os preços do algodão não aumentaram. Foi necessário que o comerciante vendesse a um fabricante de tecidos de algodão que, além dos cem francos, possa obter ainda um benefício pola sua fabricação e que distribue com ele o trabalho não pago que ele, por conseqüência, obteve.

É este trabalho não pago que, em geral, mantém todos os membros da sociedade que não trabalham. É com ele que são pagos os impostos do Estado e dos concelhos na medida em que estes atingem a classe capitalista, as rendas dos grandes proprietários da terra, etc. É sobre ele que descansa todo o estado social existente.

Mesmo assim, seria ridículo supor que o trabalho não pago só se formou nas condições actuais, em que a produção é realizada, por um lado, por capitalistas e por outro polos assalariados. Ao contrário, desde sempre a classe oprimida teve que efectuar trabalho não pago. Durante todo o longo período em que a escravidão foi a forma dominante de organização do trabalho, os escravos foram obrigados a trabalhar muito mais do que lhes era dado sob a forma de meios de subsistência. Sob a dominação da servidão e até a extinção das corveias, sucedeu-se o mesmo; e até mesmo aquí aparecia, de maneira tangível, a diferença entre o tempo em que o lavrador trabalhava para si e a mais-valia que realizava para o senhor, visto que estas duas forma de trabalho se faciam separadamente. A forma é hoje diferente, mas a cousa não mudou, e enquanto,

"uma parte da sociedade possuir o monopólio dos meios de produção , o trabalhador, livre ou não, é forçado a acrescentar ao tempo de trabalho necessário para a sua própria subsistência um mais-valor destinado a sustentar o possuidor dos meios de produção"

(Marx, O Capital, Livro I).

No artigo anterior, reparamos que cada operário que está ao serviço do capitalista executa um duplo trabalho: durante uma parte do seu tempo de trabalho, restitui o salário que lhe adiantara o capitalista, e esta parte do seu trabalho é denominado por Marx trabalho necessário. Mas, em seguida, deve continuar a trabalhar ainda e produzir durante este tempo o mais-valor para o capitalista, do que o lucro constitue uma parte importante. Esta parte do trabalho chama-se mais-trabalho.

Suponhamos que o obreiro trabalha três dias da semana para devolver o seu salário e outros três para produzir o mais-valor para o capitalista. Isto quer dizer, noutros termos, que trabalha, numa jornada de doze horas, seis diárias para o seu salário e seis horas para criar o mais-valor. Mas uma semana não tem mais de seis dias, e contando o domingo, sete tão só, assim que cada dia pode ter seis, oito, dez, doze e até quinze ou mais horas de trabalho. O obreiro vendeu polo seu salário uma jornada de trabalho ao capitalista. Mas, o que é um dia de trabalho? Oito horas ou dezoito?

O capitalista tem interesse em fazer a jornada de trabalho tão prolongada quanto possível. Quanto mais ampla for, mais mais-valor terá criado. O operário tem a verdadeira sensação de que cada hora de trabalho feita para além da restituição do seu salário, lhe é roubada; é no seu próprio corpo que sente o que significa trabalhar muito tempo seguido. O capitalista briga polo seu lucro, o obreiro pola sua saúde, por algumas horas de repouso quotidiano, para poder fornecer ainda uma outra actividade humana, fora das horas de trabalho, do sono e da comida. Notemos de passagem que não depende da boa vontade dos capitalistas tomados isoladamente, que queiram ou não comprometer-se nesta luita, a concorrência obriga o mais filantropo dentre eles a aliar-se com os seus colegas e a fazer cumprir uma jornada de trabalho como a daqueles.

A luita pola limitação da jornada de trabalho data do primeiro surgimento dos obreiros livres na história e dura até hoje. Nas várias indústrias existem normas diversas à jornada de trabalho; mas na realidade, são raramente observadas. É somente nos casos em que a lei determina a jornada de trabalho e verifica a sua observação, que se pode falar verdadeiramente de uma jornada de trabalho normal. E até hoje unicamente nos distritos industriais da Inglaterra. Aquí, a jornada de trabalho de dez horas (10 horas e meia durante cinco horas dias e sete horas e meia ao Sábado) foi fixada para todas as mulheres e para os jovens entre os 13 e os 18 anos, e como os homens não podem trabalhar sem estes últimos, ficam, também eles, sujeitos à lei da jornada de dez horas.

Esta lei foi uma conquista dos operários das fábricas da Inglaterra através de longos anos de persistência, pola luita mais tenaz e obstinada contra os fabricantes, pola liberdade de imprensa, polo direito de associação e de reunião, ademais de aproveitar as divisões no seio da própria classe dominante. A lei transformou-se na salvaguarda dos operários ingleses, e alargada pouco a pouco a todos os ramos da indústria e, no ano passado, a quase todos os ofícios, ou polo menos a todos aqueles empregados por mulheres e meninos. Sobre a história desta regulamentação legal da jornada de trabalho na Inglaterra, a obra possui uma documentação extremamente pormenorizada.

O próximo "Reichstag da Alemanha do Norte" irá igualmente discutir uma lei industrial, e consequentemente, ajustar o trabalho nas fábricas. Aguardamos que nenhum dos deputados que deve a sua eleição aos obreiros alemães, irá para a discussão sem se ter familiarizado antes com o livro de Marx.

Podem obter muito. As divisões nas classes reinantes são mais favoráveis aos obreiros do que nunca foram na Inglaterra, pois o sufrágio universal compele as classes dominantes a procurar o favor dos operários. Nestas circunstâncias, quatro ou cinco representantes do proletariado são uma potência se souberem aproveitar a sua situação, se sobretudo souberem do que se trata, cousa que os burgueses não percebem. E, por isso, o livro de Marx fornece-lhes a documentação já elaborada.

Deixaremos de lado uma série de outras investigações esplêndidas, de interesse mais teórico, e contentar-nos-emos abordando o capítulo final que trata da acumulação do capital. Demonstra-se que o modo de producção capitalista, é dizer, realizado polos capitalistas, por um lado, e polos assalariados por outro, não só reproduz sempre o capital ao capitalista, mas produz sempre, simultaneamente também, a miséria dos obreiros, e que isto faz de forma a reproduzir sempre, de um lado os capitalistas, que são os proprietários de todos os meios de subsistência, de todas as matérias-primas e de todos os instrumentos de trabalho, por outro, a grande massa dos operários que são constrangidos a vender a sua força de trabalho a estes capitalistas por uma certa quantidade de meios de subsistência apenas suficientes, no melhor dos casos, para os conservar em estado de trabalhar e para fazer crescer uma nova geração de proletarios aptos para o trabalho.

Mas o capital não se limita apenas a ser reproduzido: está continuamente se multiplicado e ampliando, e com ele, o seu poder sobre a classe dos obreiros, privados de propriedade. E enquanto se reproduz em proporções cada vez mais grandes, o modo de produção capitalista moderno reproduz assim mesmo, em proporções cada vez mais grandes e em número sempre crescente, a classe dos operários privados de propriedade.

"A acumulação do capital não faz mais que reproduzir as relações do capital numa escala mais alargada, com mais capitalistas ou mais grandes capitalistas por um lado, mais assalariados por outro… A acumulação do capital é, então, ao mesmo tempo, aumento do proletariado" (Marx, O Capital, Tomo 3) .

Mas, como para produzir todavia a mesma quantidade de produtos, precisam-se cada vez menos obreiros, graças ao progresso do maquinismo, à modernização da agricultura, etc., como este aperfeiçoamento, isto é, este excedente de obreiros, aumenta mais rapidamente que o capital crescente, o que é que se faz com este sempre crescente de operários? Formam um exército industrial de reserva que, durante os momentos de maus negócios ou mediocres, é pago abaixo do valor do seu trabalho e ocupado irregularmente ou cai ainda na assistência pública, mas é absolutamente necessário à classe capitalista para os momentos de actividade particularmente viva dos negócios, como se viu de modo tangível na Inglaterra, mas que, de qualquer maneira, vale para desbaratar a resistência dos operários ocupados regularmente e manter os seus salários a baixo nível.

"Quanto mais a riqueza social crescer… mais numerosa é a sobrepopulação comparativamente ao exército de reserva industrial. Quanto mais este exército de reserva aumenta comparativamente ao exército activo do trabalho e mais massiva é a sobrepopulação permanente, mais estas camadas compartem a sorte de Lázaro e quanto o exército de reserva é mais crescente, mais grande é a pauperização oficial. Esta é a lei geral, absoluta da acumulação capitalista."

(Marx, O Capital, Tomo 3)

Esta são, certificadas de uma maneira rigorosamente científica — que os economistas oficiais evitam quando não tentam refutá-las — algumas das leis principais do sistema capitalista moderno. E logo assim dissemos tudo? Disso nada. Com a mesma clareza com que Marx sublinha o lado nocivo da produção capitalista, prova, também de modo claro, que esta formação social era necessária para desenvolver as forças produtivas da sociedade até ao grau tal que permitisse o mesmo desenvolvimento verdadeiramente humano para todos os membros da sociedade. Todas as formações sociais anteriores foram demasiadamente pobres para isso. Só a produção capitalista cria as riquezas e as forças de produção necessárias, mas cria simultaneamente, com a massa dos obreiros oprimidos, a classe social que cada vez mais é obrigada a exigir o uso dessas riquezas e forças produtivas em favor de toda a sociedade e não, tal como hoje é, para uma classe monopolista.

Fonte: http://marxists.org/portugues/marx/1868/03/28-ga.htm




Ainda ao prof. Adrualdo.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Por não conseguir postar o comentário diretamente na última postagem por conta de um erro b-x9-não-sei-o-que-lá, em resposta ao comentário do prof. resolvi postá-lo como postagem. Lembro-me que certa feita uma postagem semelhante aconteceu no antigo blogue do professor em relação a um comentário meu. O acaso acabou dando a oportunidade de retribuir a gentileza. Aí vai.

Caro professor,

Primeiramente, agradeço a visita e a resposta. Tais atitudes apenas ressaltam as referências que fiz à sua pessoa. Respondo, também, não no interesse de levar o debate para sempre, mas apenas para manter o diálogo, ressaltando acordos e dissensos. Acredito, inclusive, que debates como esses não se esgotam apenas no campo do debate, se é que me faço entender assim.

De fato, partimos de um abismo semântico. Mas acredito que o abismo pode ser ainda maior. Pode estar, inclusive, no próprio entendimento de como uma palavra relaciona-se com seu significado e mesmo com a coisa que pretende significar. Esta é uma discussão que transborda por demais a questão, no entanto. O que é central, e apenas cito de forma bastante superficial, é que, se bem entendi, vejo no conceito que usas para definir violência muito mais confusão do que explicação. Segundo ele, mesmo atividades identificadas à desobediência civil de Gandhi, por exemplo, podem ser tidas como violentas. Até as campanhas anti-guerras norte-americanas na época do Vietnã podem ser violentas, já que ocupavam praças, faziam festivais musicais com larga potência sonora, fechavam ruas etc. O mesmo se pode dizer das campanhas por direitos cívicos do mesmo país e na mesma época dos homossexuais deflagradas a partir das mobilizações de Stonewall, por exemplo. E, neste caso, não estamos falando de um país com algo que se poderia classificar de "pouca democracia", ou mesmo tão diferente, em essência, do regime que vivemos hoje.

Não coloco que a democracia é uma formalidade. Justamente o contrário. Ela vai além delas. Isto não a identifica ao comunitarismo, às gestões plebiscitárias ou nada disto, mas a um processo sócio-histórico-político muito mais intrincado e que merece um olhar pormenorizado de suas universalidades e particularidades. O que pode ser plebiscitarismo na Venezuela, pode não ser na UFAL (claro que não foi isto que você quis dizer e, ainda deixando claro, não tenho a mesma opinião acerca do caso venezuelano apesar de também não ser um apoiador de Chávez).

Na minha opinião, isto abre sim margem a discussões acerca da maneira como a democracia é entendida. A questão paritária dos conselho que você levanta, captando bem meu texto, é um exemplo importante. A forma de gestão da Universidade, ainda hoje, carrega traços de momentos com muito menos experiência democrática. No entanto, em questões formais, ela é absolutamente legítima. Estes são os conceitos que estão em constante conflito no caso. Foi o que tentei levantar.

Quanto à criminalização, uma questão que gostaria de ter discutido no texto, mas resolvi não o fazer por seu volume já demasiado para os objetivos dele, acredito que, aí também, reside uma discussão inacabada! Apenas para citá-la: a própria criminologia liberal aponta que o crime não é uma realidade em-si, mas um "status" conferido a determinada situação extremamente particular. Partindo-se da teoria do interacionismo simbólico percebe-se que, mesmo a situações altamente semelhantes pode-se ou não conferir o "status" de crime, e o "status" de criminoso aos agentes envolvidos. Uma gama longa de autores criminólogos (Rusche, Kircheimmer, Baratta e mesmo Foucault) vem a esclarecer como este "etiquetamento" de criminoso passa por uma gama de agências (escolas, igrejas, assistência social, cárcere etc.) recrutando uma longa camada populacional bastante selecionada para o papel de pessoas que merecem ser punidas. Deixam claro, também, que as atitudes dos agentes infratores contam menos que os interesses dos agentes punitivos. Arno Dal Ri Júnior (UFSC) possui um excelente trabalho que investiga como a criação de um inimigo público comum, bem identificável a "baderneiros", "agitadores", "terroristas" e uma série de outros adjetivos (não afirmo que são utilizados por você, claro), vem a calhar neste processo que muitos identificam à defesa da democracia, mas costuma servir de pretexto para diminuição de garantias democráticas. Por isto, também, a preocupação em comparar os discursos, com a ressalva expressa, que me preocupei em fazer, à diferença dos contextos em que se dão, apesar de, no entanto, possuírem uma ampla gama de semelhanças, não só nos vocábulos, mas nas situações empregadas (estudantes, atos e protestos, reforma universitária etc.)

Quanto ao caso da FDA, talvez estejamos falando sim de fatos diferentes. Não me lembro de algo como "professores de verdade" ser citado. Mas para a discussão não cair em um jogo de "lembro-não-lembro" ressalto que isto não faz tanta diferença. O que lembro é de uma atitude excessiva por parte de um lado que tolheu o direito por parte de outro de maneira ilegitima, inclusive com falas como: "só você fala aqui?!". É claro que esta é uma questão de passagem, mas para esclarecer, as ironias do texto podem ter confundido, eu não acho que a decisão da FDA foi democrática quanto ao ReUni. Eu não acho, inclusive, que qualquer decisão tomada na UFAL o foi. Mesmo as que se posicionaram contra a adesão ao ReUni, apesar de contar com maior fronteira democrática em alguns casos (no caso do Instituto de Ciências Sociais e do Colegiado de História, por exemplo, foram tomadas em assembléias contando não apenas com os conselheiros, mas com uma gama maior de participantes da comunidade acadêmica) ainda estiveram restritas a formalidades semelhantes.

Quanto à partidarização do Movimento Estudantil, concordo que em inúmeros casos ela pode levar a problemas. Mas tenho certeza de que é também de sua opinião, que pior seria uma sociedade política que não permitisse a filiação do cidadão ao partido de sua escolha. Se o estudante é cidadão o suficiente para ser punido por um crime, por exemplo, o é também para construir uma ferramenta partidária de sua opção. Esclareço que em cinco anos de universidade, dos quais todos tiveram determinado tempo dedicado ao Movimento Estudantil, nunca estive filiado a qualquer partido político. Igualmente, no entanto, nunca fui radicalmente contra a participação dos mesmos no seio do movimento. Acredito que o problema se dá quando o movimento perde sua autonomia para as pautas dos partidos. Se este é o sentido que você aplica, talvez concordemos neste caso. No entanto, se o movimento é partidarizado, isto não ocorre porque seus membros são todos filiados a determinado partido. O que vale, também, para os membros da administração da UFAL. A gestão não precisa ser filiada ao partido do governo para agir de forma partidarizada com ele. Neste sentido, todas as atitudes dos dois mandatos da Reitoria a qual nos referimos seguiu, à risca, as políticas colocadas pelo Governo Federal para as universidades. Isto também é agir partidariamente e não é o que torna anti-democrática a participação nos espaços de decisão acadêmicos. As decisões puramente técnicas, inclusive, costumam ser de uma exceção impressionante. Geralmente elas vêm atreladas a um debate político por trás. E este debate também é sempre capitaneado, ou pelo menos conta com a adesão, de algum partido político, afinal esta é a função dos próprios.


De qualquer maneira, é um debate que continua.

Posto o comentário aqui no blogue apenas para manter este debate ainda público, o que considero importante.

Mas envio a seu e-mail a resposta, para poupá-lo da preocupação de ainda mais visitas à página. Ressaltando, sempre, que tanto elas, quanto a leitura e os comentários são sempre bem vindos e trazem grande satisfação.

Grande abraço.

Eli M.



A Democracia é uma Garota Feia e Caprichosa

segunda-feira, 3 de maio de 2010

A Democracia é uma garota feia e caprichosa


Pedimos licença ao leitor para iniciar o texto com duas citações:


Quem causou o tumulto foram os estudantes. Eles invadiram a reunião gritando e pedindo 'democracia' (risos). Bateram nos seguranças. Cercaram os que compunham a mesa. Os alunos denunciados estavam na tal manifestação, que não foi nada pacífica. (…)

A Reitora já cometeu o erro de negociar com baderneiros. (…) os mesmos baderneiros partiram para a briga e conseguiram barrar a reunião do CONSUNI pela violência. (…)

Assim, a despeito da questão criminal houve desrespeito pela instituição e pela democracia, já que estavam atrapalhando uma reunião legalmente constituída de um órgão que tem representação de todas as instâncias da Universidade”.


E:


A resposta de que nós havemos de levar este país para diante, sem violências, sem arbítrio, dentro da normalidade democrática, mas garantindo ao país aquilo de que ele mais precisa (…) a paz. Esta paz será assegurada, quer queiram, quer não queiram os agitadores. Eles pedem sangue, mas o país prosseguirá sem sangue porque não estamos com a idéia de violência. Nós queremos a paz; queremos o trabalho e a democracia real; a democracia respeitada, acatada com autoridade para dar ao povo aquilo de que ele precisa”.


Diferenças e semelhanças:


A primeira citação foi retirada do blogue do Prof. Adrualdo Catão, efetivo da Faculdade de Direito de Alagoas (FDA – UFAL), no portal Cada Minuto, em postagem do dia 14 de abril de 2010. Reporta-se a processo criminal sofrido por estudantes que protestavam na época em que a Universidade Federal de Alagoas, decidiu por sua adesão ao programa de expansão do Governo Lula: o ReUni, parte da Reforma Universitária do governo.

A segunda citação também reporta-se a casos de conflitos entre autoridades e estudantes. Desta vez, são estudantes da Guanabara (RJ), que perfaziam protestos contra a morte de um colega executado pela polícia.

Edson Luís morria em 28 de março de 1968, em meio a ação da polícia em uma manifestação por melhores condições do restaurante estudantil Calabouço e contra a Reforma Universitária do então governo, baseada nos acordos MEC-USAID. A 31 de março, a citação acima era feita pelo então presidente Costa e Silva, como parte de seu discurso de comemoração da “Revolução de 1964”. Meses mais tarde, em dezembro, este mesmo presidente assinaria o famoso Ato Institucional nº 5, que daria abertura ao período de linha dura do governo militar no Brasil, marcado por inúmeros desrespeitos às garantias fundamentais de seus cidadãos.

De pronto, ressaltamos as diferenças das falas. Elas estão postas em seus autores. Diferente do presidente militar, acreditamos que o prof. Adrualdo é um sincero defensor das garantias democráticas dos cidadãos. Por isto mesmo, nos sentimos confortáveis em utilizarmos seu texto não para fazer uma resposta direta, mas para aproveitar os pontos de debates que levanta.

Mas nosso objetivo é apontar as semelhanças: defesa da democracia; imputação da violência aos que protestam (baderneirosagitadores); posição favorável às instituições tal como estão. É evidente que se deve considerar o contexto de cada fala, mas o crucial pode ser demonstrado aqui, em especial no que diz respeito à fala do presidente militar e as ações que tomou durante seu governo: a democracia não se faz só com palavras, nem apenas com o total respeito às instituições. O discurso da defesa da democracia na maior parte das vezes acaba sendo uma defesa, quase elevada à cegueira, dos métodos formais já estabelecidos. Ou seja: das coisas como estão. Acreditamos que não é aí que reside a verdadeira experiência democrática.


Um debate sobre fatos


Estivemos presentes durante todos os últimos processos de mobilização dos estudantes na Universidade Federal de Alagoas. Foram inúmeros atos públicos, duas ocupações do gabinete da Reitora (2005 e 2007), organizações de seminários de debates, encontros estudantis etc. Participamos do processo de discussão acerca da adesão ao ReUni, por parte da UFAL. Esta participação se deu tanto nas instâncias estudantis, quanto nas gerais da universidade. Narramos os fatos porque, diferente do prof. Adrualdo, vimos eles acontecerem no local e na hora em que aconteciam. Assim como o professor, não temos a pretensão de discutir as questões meramente penais, mas as conexões gerais que envolvem a questão.

O ano de 2007 tinha sido fervoroso para o movimento estudantil. No primeiro semestre, quase 30 reitorias ao longo do país foram ocupadas. Sua principal reivindicação: assistência estudantil. Na UFAL não foi diferente. Aquilo a que Adrualdo se reporta, na mesma postagem e não sem ironia, como “coisa linda”, foi a causa da ampliação do Restaurante Universitário; do fim de taxas acadêmicas na UFAL; do compromisso da Reitora com a fundação de uma escola técnica agrícola voltada para a agricultura familiar e a agroecologia; do fim de taxas para estudantes com filhos no Núcleo de Desenvolvimento Infantil da UFAL, nossa creche, e de uma outra série de direitos, ligados à assistência estudantil, que foram arrancados da Reitoria graças àquela ocupação.

O professor cita que foi um erro da Reitora negociar com os estudantes. A questão é justamente o contrário. A Reitora nunca negociou com os estudantes, a não ser em momentos como aquele. A negociação só foi conseguida graças àquela “coisa linda”.

No decorrer do segundo semestre o Governo Lula lança a proposta do ReUni que deveria ser discutida em seis meses. Não discutiremos o decreto aqui, posto que não é o objetivo, mas basta dizer o seguinte: o que deveria ser discutido em seis meses em todo o Brasil tinha como modelo a reforma universitária européia, chamada de processo de Bolonha, que foi feita em um debate que durou mais de 10 longos anos, e ainda assim encontrou problemas após sua implementação. Na UFAL, o debate foi feito em pouco menos que dois meses. Mas há quem diga que a democracia requer formalidades, não tempo para debate.

Na Faculdade de Direito, ele foi feito em 14 dias, com duas sessões do conselho de centro. A sessão do conselho de aprovação do projeto na FDA, inclusive, contou com uma cena antológica. Enquanto um estudante falava, um professor exaltado começa a gritar, interrompendo o aluno, sob alegação de que ele estava falando demais. Aos gritos, o professor invoca o “direito de impressão”, argumentando que não era obrigado a ouvir aquilo.

Um professor cala um estudante no grito! Nenhum baluarte da democracia da FDA, ou da UFAL, que não os próprios estudantes, comentou esta “coisa linda” publicamente, colocando-se contra ela. Mas a democracia foi feita, afinal, havia quorum, os conselheiros votaram e aprovaram a adesão ao ReUni, todas as formalidades foram acatadas e cumpridas. É isto que conta na ata.

No debate geral da Universidade o que aconteceu perdeu as vestes simbólicas. Foi muito mais cru. Prof. Adrualdo talvez não tenha tido a seguinte notícia: os primeiros protestos de estudantes no Conselho Universitário eram pela aceitação de seu conselheiros. A Reitora, na condição de presidente do conselho não estava aceitando a posse dos conselheiros estudantis retirados em processo próprio e autônomo como categoria da universidade. Foi necessário um parecer da Procuradoria Geral da UFAL que não conseguia sustentar os argumentos da própria Reitoria, para que a posse dos conselheiros estudantis fosse feita.

Ainda assim, os estudantes sabiam que os seus conselheiros, por si só, não tinham condições de fazer um debate justo, ou seja, em igualdade de condições argumentativas com a administração da UFAL. Perceba-se a composição formal do Conselho Superior da UFAL, a partir de um simples dado: os conselheiros estudantis, eleitos por seus pares, são em número de oito; o Reitor e Vice-Reitor têm direito a voto como muita justiça; mas, além deles, os Pró-Reitores, em número de oito, têm direito a voto. Esclareça-se: Pró-Reitor não é eleito por ninguém, é um cargo comissionado da Reitoria. Ou seja, só administração central da UFAL tem mais votos do que todos os estudantes juntos. Mas as formalidades estão absolutamente cumpridas.

A partir desta realidade, os estudantes propuseram ao Conselho Universitário uma consulta à comunidade acadêmica acerca da adesão ao ReUni, através de um plebiscito em que todos pudessem votar. A realidade, por muitas vezes, é irônica. E mesmo sem ter dado o conselho na hora exata, é como se o prof. Adrualdo tivesse convencido a Reitora. Ela não negociou esta pauta dos estudantes. Defendendo todas as formalidades do Conselho Universitário, ela apenas passou por cima da proposta e firmou posição em manter a decisão no conselho, sem qualquer consulta aberta à comunidade acadêmica.

Nos dias que correram, os estudantes organizaram um abaixo-assinado que, em apenas uma semana, reuniu algo em torno de 4.000 assinaturas, em uma Universidade que contava com quase 16.000 estudantes. Se todas as assinaturas fossem de estudantes (contavam-se também nomes de técnicos e professores), aproximadamente 25% do corpo discente seria a favor do plebiscito. Os estudantes apresentaram esta proposta na reunião seguinte do ConsUni. A Reitora sequer colocou para apreciação do plenário, pois queria votar de pronto a adesão ao ReUni. A partir daí é que os estudantes organizaram o ato em plena reunião. Ressalte-se, não era contra a adesão ao ReUni, mas por uma consulta ampla à comunidade acadêmica! A Reitora, escondeu-se atrás das formalidades do Conselho Superior, alegando que ali residia a democracia! Aqui surge o perigo de que falávamos no início do texto.

Estivemos presentes no Conselho até o fim. Vimos o momento em que os seguranças da Servipa entraram no auditório, por cima das cadeiras, descendo violentamente sobre os estudantes. Vimos que inúmeros conselheiros entravam e saíam do auditório no momento em que desejavam, tendo de enfrentar apenas a dificuldade de locomoção devido ao imenso número de pessoas que acompanhava o caso (a democracia, além de tempo, também requer espaço físico). O próprio vídeo gravado e editado pela Assessoria de Comunicação da UFAL, utilizado como prova do processo criminal, mostra o prof. Andreas Krell, da FDA, retirando-se da reunião (e não é o único) em pleno momento em que estudantes de Maceió e de Delmiro Gouveia discutiam entre si acerca da Reforma Universitária. Ainda assim, acusa-se os estudantes de violentos e de impedirem a locomoção no conselho.


A Democracia é feia e caprichosa


Saindo da reunião que terminou com tristes cenas de violência por parte da segurança patrimonial da UFAL, os estudantes organizaram-se em um acampamento no pátio da Reitoria e convocaram uma assembléia estudantil para o dia seguinte. Nesta assembléia estiveram presentes, pelo menos, 200 estudantes.

A assembléia foi puxada publicamente e abertamente divulgada. Sabia-se o horário de seu início. Dia 11 de dezembro, às 17h, pátio da Reitoria. Quando a reunião dos 200 estudantes estava para começar ouve-se sirenes e motores. Dois furgões da Polícia Federal entram na universidade e estacionam em frente à Reitoria. Os policiais descem dos veículos armados com metralhadoras. A imprensa registrou o fato à época.

O delegado federal interrompe a assembléia estudantil e declara que recebeu a denúncia de que estudantes perfaziam atos de violência naquele mesmo momento, destruindo o patrimônio da UFAL. Chegou a dizer que tal denúncia havia sido feita por um membro da administração da universidade, não especificou se funcionário ou gestor. Interrompendo a assembléia dos estudantes, ele faz uma longa vistoria pelo prédio e sai de lá sem poder apontar absolutamente nada de errado. Mas a assembléia já havia sido comprometida.

Em postagem do dia 27 de abril de 2010 em seu blog, prof. Adrualdo declara que o papel do professor de direito em casos de conflitos é:


ponderar ambos os lados e tentar encontrar um caminho que sirva ao interesse maior que é a melhoria da educação e a formação do aluno.
Quando, todavia, o conflito se dá entre quem respeita os direitos fundamentais e quem não respeita, perece-me que a resposta óbvia é ficar com o primeiro grupo”.


Está aí uma bela oportunidade de mostrar que não há apenas palavras neste texto. A polícia e a administração da UFAL atentam claramente contra o direito constitucional à livre reunião para fins pacíficos quando invadem uma assembléia estudantil sob o pretexto de que está havendo alguma desordem no local. Mais uma vez, só os estudantes se manifestaram contra esta “coisa linda”. A respeito disto, lançamos o desafio a quem quer que seja de apontar e provar a existência de danos a qualquer parte do patrimônio da Universidade que tenham sido ocasionados durante as mobilizações estudantis dos últimos períodos na UFAL, especialmente as duas ocupações de gabinete da Reitoria em que os alunos passaram dias acampados no prédio.

Nunca houve, pelo menos no histórico recente, nenhum relato de violência por parte dos estudantes da UFAL que pudesse justificar qualquer atitude semelhante a enviar a polícia para vigiá-los. No entanto, o discurso da Reitoria e de seus apoiadores, é semelhante, em todos os seus aspectos, ao discurso da ditadura militar. “Os estudantes são violentos, agitadores, partidários; nós somos a defesa da democracia”. Se o discurso é o mesmo em essência, exigir que as atitudes fossem diferentes seria pedir incoerência à Reitoria. Disto não podemos acusá-la.

Os que estão ganhando com essa democracia de respeito às formalidades entendem ela como idílica, pacífica, calma. Achamos que a Democracia não é assim tão bonita, no entanto. Ela é uma garota feia e caprichosa. Feia, porque a Democracia só existe porque existe o conflito, e não a paz. E mesmo que esse conflito não vá às beiras da violência, o que é triste quando acontece, ele não pode ser jogado para debaixo do tapete das formalidades. O conflito está na face da Democracia, e o pior é que quanto mais ela se maquia, mais ele se treme em aparecer, e quando surge vem mais intensamente. Afinal a democracia é caprichosa. Ela não se aqueta. Ela não acata a autoridade. Ela nasceu de um desacato à autoridade, e vai carregar isso para o resto da sua história.

Por que, então, a Democracia é tão querida por todos? Por que todos querem que ela esteja do seu lado? Ela por si só virou a legitimidade de qualquer coisa. Esse é o perigo do mero respeito à formalidade, pois não importa o conteúdo, não importam os meios, o que importam são os requisitos formais.

A Democracia é uma garota feia e caprichosa, mas o dote que o pai dela tem a oferecer para quem com ela se casar é imenso. Por isso, uma corja enorme de pretendentes tenta provar que a Democracia está casada com eles: para legitimar seu acesso ao dote. Mas ela teima em fazer os pretendentes passarem por momentos de irritação quando não se comporta como eles querem, de acordo com as regras e os bons modos.

A Democracia, felizmente, vai prosseguir sendo essa moça caprichosa. E o Movimento Estudantil sabe disso e é por isso que vai à luta. Mesmo diante dos ocupantes máximos dos postos da “democracia” ele insiste em propôr democracia, e esta proposta costuma ser rejeitada de pronto. A Reitoria e seus apoiadores continuarão a se apegar às legitimidades formais que garantem suas decisões burocráticas. Os estudantes sofrerão processos judiciais. Este é o peso para os que não se escondem atrás das “maiorias silenciosas” que acatam a autoridade e sem desrespeito à instituição da “democracia” meramente formal.